Translate

sábado, 30 de janeiro de 2010

O que é pior:negar a cristo ou segui-lo por motivaçoes erradas?

por
Dr. David Martin Lloyd-Jones


“Desde então muitos dos seus discípulos tornaram para trás e já não andavam com ele. Então disse Jesus aos doze: queria vós também retirar-vos? Respondeu-lhe pois Simão e Pedro: Senhor para quem iremos nós? Tu tens as palavras da vida eterna” (João 6:66-68).

Sinto que é sempre um tema interessante e proveitoso tentar decidir qual destas duas posições é mais perigosa para um homem - declarar franca e abertamente que não tem qualquer interesse em Cristo e na religião ou seguir a Cristo motivado por uma razão falsa ou errada. Sei que cada teólogo nesta congregação será levado a dizer imediatamente que em última análise não há nenhuma diferença entre os dois; que o homem que segue a Cristo por uma razão errada esta tão fora do reino de Deus quanto aquele que não manifesta qualquer desejo de seguir a Cristo. Isso é verdade, porém eu creio que há uma distinção muito importante entre os dois se os examinarmos puramente do ponto de vista humano, pois o problema com o homem que segue a Cristo por uma razão falsa ou errada é que ele não só esta iludindo a si mesmo, mas também está enganando a Igreja. Mas quando nos defrontamos com um quem não crê em Cristo, então sabemos exatamente o que dizer e o que fazer com ele. Quando um homem se apresenta como uma pessoa religiosa, a Igreja tende a aceitar suas declarações pensando que seria um insulto questioná-lo. A Igreja presume que uma vez que ele professa ser religioso, isso significa que ele é um cristão. Um dos lugares mais perigosos para um homem é a Igreja do Deus vivo.
Creio que este ponto poderia ser uma boa explicação para a atual situação da Igreja hoje em dia. Vemos uma excessiva prontidão em ligar o fato de alguém ser membro de uma Igreja com verdadeiro discipulado, presumindo que todos aqueles que se unem à Igreja realmente estão seguindo a Cristo. Sei que a Igreja talvez tenha bons motivos para isso. Ela sente que é bom que as pessoas estejam sob sua influência, para que possam ser protegidas das tentações do mundo. A tragédia, no entanto, é que com freqüência ela toma por certo que essas pessoas são verdadeiramente cristãs. E assim a igreja tem dirigido a tais pessoas mensagens que são apropriadas para o verdadeiro cristão, mas que não têm muito valor para aquele a quem falta a essência da fé. Então é por isso que afirmo que a Igreja pode ser um lugar muito perigoso. É possível que por pertencerem à Igreja tais pessoas nunca venham a ouvir algumas das perguntas fundamentais e básicas que todo cristão deve ser capaz de responder. Existe um perigo muito real de presumirmos por razões erradas e falsas que somos cristãos. E não hesito em declarar que é um perigo muito grande e real. E se vocês pedissem que eu comprovasse e justificasse o uso desse adjetivos, eu poderia fazê-lo com facilidade por meio das páginas do próprio Novo testamento.
Certamente não há nada mais notável, na leitura da história da vida de nosso Senhor Jesus Cristo nos Evangelhos, do que observar a forma como Ele sempre quis Se certificar que homens e mulheres não O seguissem motivados por uma razão errada. Vocês podem encontrá-lo constantemente parando e perguntando a homens e mulheres se O estavam seguindo pela razão certa. Ele parecia preocupado em não atrair aqueles que não tinham se apropriado do que era certo e verdadeiro. Não há maior paródia da vida de Cristo do que declarar que nosso bendito Senhor, no fim de Sua vida, ficou decepcionado quando Se viu abandonado por seus amigos; que Seu coração se partiu porque Ele nunca imaginara tal deserção, e que ela O surpreendeu. Não há nada mais falso, à luz do quadro que o Novo Testamento dá de Jesus. Lemos que nosso Senhor estava ciente dessa possibilidade desde o princípio e até mesmo a predisse. Ele Se esforçava constantemente para examinar Seus seguidores porque sabia com certeza o que iria acontecer no fim. Todos lembramos as maravilhosas palavras do Senhor no fim do sermão do Monte: “Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor não profetizamos nós em teu nome? E em teu nome não expulsamos demônios? E em teu nome não fizemos muitas maravilhas? E então lhes direi abertamente: nunca vos conheci apartai-vos de mim”. Eles pensavam que tudo estava bem; mas naquele dia descobrirão que estavam errados. Lembramos também da parábola da casa edificada sobre a rocha e da que foi edificada sobre a areia: “Prestem atenção como vocês escutam!” diz o Senhor. “Examinem-se e esquadrinhem-se a si mesmos”. Também lembramos da parábola do semeador, em que nosso Senhor parece estabelecer, como um princípio fundamental, que dentre todos os que O seguem, somente vinte e cinco por cento realmente têm apreendido a verdade. Quero também chamar a sua atenção para a parábola da rede que recolheu um certo número de peixes de toda qualidade — alguns bons, e outros maus —realçando a grande diferenciação entre as pessoas. Mas talvez a ilustração mais perfeita desse princípio pode se encontrada em um dos três quadros apresentados no fim do nono capitulo do Evangelho de Lucas. Vocês por certo se lembram do jovem que veio a Jesus dizendo: “Senhor ,eu te seguirei onde quer que fores”. Talvez acrescentando: “não sei quanto a essas outras pessoas, porém eu estou do Teu lado”. “Certamente”, alguém dirá, “esse é o tipo de homem que a Igreja de Deus está buscando hoje em dia. Certamente nosso Senhor o recebeu de braços abertos!” Mas foi a esse homem que Jesus disse: “As raposas tem covis e as aves do céu ninhos, mas o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça”. Cristo Se volta para esse zelote, e diz: “Você esta cheio de zelo, entusiasmo e êxtase, mas realmente entende o que significa Me seguir? Significa ostracismo, e talvez renúncia às coisas que mais valoriza na vida. Certifique-se de que sabe exatamente o que significa discipulado cristão”. Ao ler os Evangelhos, vocês verão que nosso Senhor estava constantemente advertindo as pessoas, e esclarecendo que havia a possibilidade de alguém segui-lO motivado por uma razão errada ou espúria.
Os escritores das Epístolas reiteraram a mesma mensagem, inculcando-a nos cristãos da Igreja Primitiva.
Não seria bom que examinássemos a nós mesmos, fazendo a mesma pergunta, ou seja, se O estamos seguindo motivados por uma razão certa ou errada? Por que estamos seguindo a Jesus? Qual é o significado exato que vemos em nossa ligação com a igreja que freqüentamos? Essa é a pergunta que eu gostaria de examinar com vocês à luz deste texto. Sempre achei que este capítulo (João 6) é um exemplo clássico de todo esse assunto. O evangelista, sob inspiração divina, parece ter reunido neste capítulo a maior das razões falsas ou espúrias pelas quais homens se contentam em seguir a Cristo : todas estão agrupadas aqui. Observe a divisão do texto.
“Desde então muitos dos seus discípulos tornaram para trás”. Por outro lado os doze permaneceram. Aqui está a divisão — os muitos que voltaram atrás e os poucos que permaneceram. Muitos O tinham seguido pela razão errada. Poucos O seguiram e O acompanharam motivados pela razão certa e verdadeira.
Vamos examinar, antes de tudo, algumas das razões erradas pelas quais homens seguem a Jesus Cristo. Existem pessoas que se unem a uma igreja pela simples razão que muitos outros estão fazendo a mesma coisa. Vemos claramente no Novo Testamento, bem como na história subseqüente da Igreja Cristã, uma vasta expressão de psicologia das massas. Há pessoas que sempre estão prontas a se unirem a uma multidão, e sempre ficam fascinadas por aquilo que todos os demais parecem estar fazendo. Há pessoas que estão numa igreja pela simples razão que alguém as levou ou então viram outras pessoas indo a essa igreja. Nunca perguntaram a si mesmas: “Porque estou na igreja?” Parece ser a coisa certa a fazer: os pais e os avós fizeram isso; é uma tradição em sua localidade; outros fazem isso, e, portanto, elas também fazem. Há pessoas que simplesmente “nadam com a corrente”. Fazem algo porque outras pessoas estão fazendo aquilo. Deus permita que nenhum de nós nesta igreja irrefletidamente, sem jamais ter considerado o significado de ser membro de igreja, e o que está envolvido. Houve muitos que seguiram o Senhor simplesmente porque viram que as multidões O rodeavam. Que o Senhor nos liberte de ser parte desse grupo!
Outra razão foi mencionada pelo Senhor no versículo 26: “Na verdade na verdade vos digo que me buscais, não pelo sinais que vistes, mas porque comeste do pão, e vos saciaste”. Que Ele quis dizer com isso? Ele estava sugerindo que essas pessoas tinham uma razão puramente mercenária e materialista para segui-lO. Vieram correndo após o Senhor, e aparentemente O estavam adorando; mas não estavam realmente interessadas no aspecto espiritual, no divino e no sobrenatural. Por que O seguiram? Porque receberam dEle aquilo que as atraía — os pães. Estavam ansiosas por alimento, e por essa razão egoísta é que seguiram a Jesus, porque receberam dEle aquilo que desejavam. Não sei se esta razão é uma razão muito comum para que as pessoas se unam à Igreja, pois a religião não é tão popular hoje em dia como era no passado; porém temos que concordar que talvez a verdadeira tragédia era que os homens tinham a tendência de se unirem à Igreja porque ela lhes dava posição, reputação, poder e influência. Infelizmente muitos há que se uniram à Igreja pelo motivo que isso beneficiaria seus negócios ou sua profissão; fizeram uso da Igreja para o avanço de seus interesses ou desejos pessoais. São as pessoas que seguem a Cristo porque desejam comer do pão que Ele dá, porque querem se satisfazer. Talvez devêssemos incluir nesta categoria aqueles que seguem a Cristo porque estão interessados na doutrina do perdão dos pecados, e porque querem tirar proveito da Sua cruz; eles não querem sofrer o castigo eterno; não gostam da noção do inferno. Cristo anuncia perdão dos pecados, e eles O seguem, não porque desejam santidade ou porque realmente O amam, mas só porque temem o inferno e estão com medo do castigo eterno. Esta são as pessoas que tornam até mesmo a cruz de Cristo em mercadoria, e a usam como um manto para cobrir seus pecados. Usam a cruz para o proveito dos seus próprios desejos pessoais e mercenários. Seguem a Cristo somente para os seus próprios fins, e não porque Ele é o Filho de Deus e o Salvador do mundo.
E então, no versículo 2 deste capítulo, encontramos outra coisa muito interessante: “E grande multidão o seguia; porque via os sinais que operava sobre os enfermos”. Ora, este é um tipo de pessoa muito interessante, e que encontramos com freqüência nas páginas do Novo Testamento. Temos uma descrição do mesmo tipo de pessoa no segundo capítulo: “E, estando ele em Jerusalém pela páscoa, durante a festa, muitos vendo os sinais que fazia, creram no seu nome” (João 2:23). Este grupo dos que estão preocupados com os aspectos externos da região parece ser bem grande na época atual. São as pessoas que estão interessadas no fenômeno da religião parece ser bem grande na época atual. São as pessoas que estão interessadas no fenômeno da religião; elas seguem a Jesus porque vêem os milagres que Eles realiza. O poder miraculoso de Cristo as atrai. Se há manifestação de poder sobrenatural, elas sempre estão lá. São atraídas pelo fenômeno da religião, e não pela verdade da religião. Nosso Senhor Jesus Cristo realizou muitos milagres; e Ele o fez deliberadamente. Seu alvo e propósito ao realizar milagres foi manifestar o Seu poder. Todavia, notamos algo interessante. Ele não confia naqueles que estão mais interessados nos milagres do que nEle mesmo ou naqueles que estão mais interessados no fenômeno do que no poder. Jesus Cristo, pela graça de Deus, ainda opera milagres neste mundo pecaminoso, e ainda transforma a vida das pessoas. Ainda existem fenômenos gloriosos em conexão com o reino de Deus em Cristo Jesus. Mas Cristo, o Filho de Deus, não veio à terra simplesmente para realizar milagres ou fazer obras maravilhosas, e assim manifestar o Seu poder; e nem veio apenas para mudar nossas vidas; Ele veio, antes de tudo, para purificar para Si um povo Seu especial, zeloso de boas obras. Ele veio para reconciliar os homens com Deus, e para nos levar ao conhecimento da verdade. Devemos nos precaver de segui-lO simplesmente porque estamos mais interessados no fenômeno do que na verdade em si.
E isso me traz ao último grupo, que é encontrado nos versículos 14 e 15, onde lemos: “Vendo pois aqueles homens o milagre que se Jesus tinha feito, diziam: este é verdadeiramente o profeta que devia vir ao mundo. Sabendo pois Jesus que haviam de vir arrebatá-lo, para o fazerem rei, tornou a retirar-se, ele só, para o monte”. Temos aqui um grupo muito interessante de pessoas, que O seguem porque estão completamente enganadas a respeito de Cristo e de Sua mensagem. Qual foi o milagre que tinham visto? Foi o dos cinco mil sendo alimentados. Essas pessoas, de acordo com o contexto, tinham seguido o Senhor por alguns dias ou talvez semanas. Tinham ouvido as Suas Palavras; mas foi somente quando viram o milagre que disseram: “Este é o Messias. Este é o profeta que havia de vir”. Então lemos que conspiraram entre si e concordaram que deviam se aproximar dEle e levá-lO à força para Jerusalém, a fim de O proclamarem rei. Jesus, porém, percebeu sua intenções e Se retirou para um monte, permanecendo ali sozinho. Aqueles judeus tinham uma concepção política do reino de Deus. Pensavam no Messias como um libertador político, como alguém que os libertaria da escravidão de Roma e Se estabeleceria como rei em Jerusalém, onde reinaria supremo sobre todos os Seus inimigos e sobre o mundo todo. E esses homens se aproximaram dEle com essa idéia em suas mentes; mas Ele os repeliu. E aqueles homens acabaram sendo parte do grupo que se afastou dEle. Quantos, ainda hoje, pensam em Jesus como um revolucionário político, ou um reformador social! Quantos ainda hoje pensam no reino de Deus como sendo primeiramente secular e político! Quantas pessoas pensam que uma das funções principais da Igreja é tratar da condição social do mundo, e assumir o seu lugar nos vários setores e níveis da vida humana, e decidir as grandes questões relacionadas com a indústria e a política e assuntos internacionais! Quantas pessoas ainda pensam em Cristo como um reformador social ou agitador político! E quantas outras pensam nEle como o pálido Galileu que mantém os homens à distância, e que é refinado demais até para tocar no mundo. Há os que pensam nEle como o grande Artista, ou o grande Asceta ou o incomparável Filósofo. Há os que se aproximam da Bíblia como se fosse apenas uma coletânea de jóias literárias. Se tirássemos todos esses grupos da Igreja, eu me pergunto quantos restariam! Receio que esse “muitos” assumiria proporções alarmantes!
Creio que não preciso me justificar se lhes fizer a pergunta: “Vocês seguem a Cristo? Já se defrontaram com esta pergunta? Já encararam estas possibilidades face a face?” Essas pessoas que eu mencionei estavam seguindo a Cristo. Tinham estado com Ele por vários dias; consideravam-se Seus discípulos. Mas então lemos que muitos dos Seus discípulos, Seus seguidores, aqueles que tinham ouvido Suas palavras, já não andavam mais com Ele. Porque é que nós O seguimos? Somos motivados pela razão correta ou somos culpados de seguirmos motivados por uma dessas razões falsas? Qual é a verdadeira razão para seguirmos a Cristo? A resposta naturalmente está nas grandes palavras de Simão Pedro: “Então disse Jesus aos doze: quereis vós também retirar-vos? Respondeu-lhe pois Simão Pedro: Senhor, para quem iremos nós? Tu tens as palavras da vida eterna. E nós temos crido e conhecido que tu és o Cristo, o Filho de Deus”. Ora, podemos nos alegrar com esta resposta, pois, como o contexto nos revela, o Senhor testou a fé do doze. Muitos estavam se afastando. “Lá vão eles; estão vendo?” diz o Senhor, voltando-Se para os doze. “Eles ouviram os mesmo sermões que vocês, e viram os mesmos milagres; vocês estão exatamente na mesma posição. Querem ir com eles? Vocês tem Me seguido pela mesma razão que eles? Porque, se é assim, prefiro que não Me sigam. Vocês também querem retirar-se?” E Simão Pedro respondeu com confiança e com certeza. Temos aqui, em suas palavras, o mínimo irreduzível do verdadeiro discípulado cristão. Que significam essas palavras de Pedro? Precisamos dividi-las e analisá-las. “Senhor, para quem iremos nós?” ele indaga. Devemos interpretar essa frase unicamente de uma forma emocional? Como se Pedro tivesse se voltado para o Senhor, dizendo: “Tivemos tantos momentos maravilhoso juntos, e a vida seria impossível sem Ti”. Era simplesmente uma ligação emocional? Sim, era, mas também era muito mais que isso. Era uma definição de fé básica e profunda. “A quem iremos, se Te deixarmos?” Porque ir a alguém? Por que Pedro faz essa pergunta? Porque aqui descobrimos a declaração primária da confissão cristã. Pedro pergunta: “A quem iremos nós?” porque entende que não pode salvar-se a si mesmo. Pedro havia compreendido há muito tempo sua própria condição sem esperança. Ele estava buscando salvação em alguém fora de si mesmo. E, tendo enfrentado a lei, e tendo visto a João Batista, e tendo contemplado a face de Cristo, ele tinha reconhecido há muito tempo a sua condição diante de Deus. Junto com os seus compatriotas, ele estivera aguardando o Messias. Todavia, Pedro não se limita a admitir que não pode salvar a si mesmo. Ele também declara aqui, peremptoriamente, que tem certeza absoluta que ninguém mais pode salvá-lo senão Cristo. A quem mais podemos seguir? Não há nenhum outro. “Eu não posso me salvar a mim mesmo e nenhum homem pode me salvar”, diz Pedro. Sempre há esta declaração negativa na confissão cristã primária e básica. Eu me pergunto em quê, ou em quem, estamos depositando a nossa confiança e a nossa fé? O homem que tem qualquer alternativa concebível para Cristo não é um cristão. A que nos apegamos, quando pensamos em morte e eternidade? Ainda estamos confiando nessa ilusão de um mundo que está, supostamente, avançando e se desenvolvendo? Ainda imaginamos, credulamente, que meras realizações intelectuais podem nos preparar para o céu?
“Não posso salvar a mim mesmo”, diz Pedro. “Homens não podem me salvar. O mundo não pode me salvar. Mas eu creio que Tu podes”. E ele dá esta razão: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo. Tu tens as palavras da vida eterna”. Na face de Jesus Cristo, Pedro viu a Deus.
Vocês já tomaram uma posição com Simão Pedro? Já compreenderam sua própria falência e pecaminosidade? Já disseram a Cristo: “Tu tens que me salvar, e Tu somente?” Pedro não se contenta em apenas declarar que Cristo é o Filho do Deus vivo. Ele diz: “Não podemos Te deixar, pois Tu tens as palavras da vida eterna”. Foram essas palavras de Cristo que fizeram com que os outros se retirassem. Essas pessoas tinham seguido a Cristo; tinham escutado Seus sermões; tinham observado Seus milagres. Então nosso Senhor, em uma de Suas mensagens, comparou-Se a Si mesmo com o maná mandado do céu, e continuou dizendo que Ele era o pão da vida, e quem não comesse da Sua carne jamais poderia ter vida eterna. “Muitos pois dos seus discípulos, ouvindo isto, disseram: duro é este discurso”. E finalmente acabaram se afastando por causa dessas palavras. Ele falou que os homens deviam comer da Sua carne e beber do Seu sangue, e estabeleceu isso como uma condição essencial para a vida eterna. “Como pode ser isto?” perguntaram. Foram essas palavras que os ofenderam. Pedro, no entanto, diz: “Eu não entendo tudo, mas eu creio”. Meus amigos, não basta atribuirmos divindade a Jesus de Nazaré de forma singular. Não é suficiente que creiamos sem Seus milagres e em Suas obras sobrenaturais. Nós somente estamos seguindo Cristo, real e verdadeiramente, quando cremos que é Ele quem opera a nossa salvação através do Seu corpo quebrado e Seu sangue derramado. “Eu não entendo a doutrina da expiação; não posso compreender seu significado; parece absurda, e quase imoral”, vocês dizem. Não estou pedindo que entendem isso tudo. Simão Pedro não entendia, mas assim mesmo a aceitou, e entregou a sua vida a Cristo. Jesus Cristo Se oferece a nós, crucificado e ressurreto — alguém que foi ferido pelos açoites que nós merecíamos, que deu Sua vida em resgate por muitos, que, pelo Seu Espírito Santo, quer habitar em nós; que não só nos liberta da culpa do nosso pecado passado, mas que também nos liberta do poder do pecado, e da poluição do pecado, e que está adiante do nós, dizendo: “Apropriem-se de Mim”.
“Quereis vós também retirar-vos?” Milhares estão se retirando. Na verdade, esta nação e o mundo estão se tornando cada vez mais ímpios. O homem, em seu orgulho intelectual, está rejeitando a Palavra de Deus. “Quereis também vos retirar-vos?” Que todos nos voltemos para Ele, como Simão Pedro, dizendo: “Senhor, para quem iremos nós? Tu tens as palavras da vida eterna. E nós temos crido e conhecido que tu és o Cristo, o Filho de Deus”.

* Sermão pregado na manhã da primeira visita do Dr. Lloyd-Jones à Capela de Westminster, no dia 29 de dezembro de 1935; e anteriormente, em Sandfields.















.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

A essência do Cristianismo é a vida de Cristo em nós

A essência do Cristianismo é a vida de Cristo em nós Uma grande preocupação entre os mais lúcidos cristãos, ao longo dos anos, foi a fatal tendência da igreja em retirar Jesus do centro, mesmo que se diga o contrário. Doutrinas, ensinos teológicos, apostilas, livros, pensamentos e tantas outras formas de expressar conclusões personalizadas de verdades, são oferecidos como alimento espiritual no lugar da pessoa de Jesus. O irmão e profeta A W Tozer, falecido em 1963, expressou esta preocupação em quase todos os seus escritos, tal como o texto abaixo, parte do livro “A Conquista Divina”: “Sem dúvida sofremos a perda de muitos tesouros espirituais porque deixamos que se escapulisse a simples verdade de que o milagre da perpetuação da vida está em Deus. Ele não criou a vida e a arremessou para longe de Si como algum petulante artista desapontado com sua obra. Toda a vida está Nele e fora Dele, Dele fluindo e retornando a Ele, um mar móvel e indivisível cuja fonte é Ele. A vida eterna que estava com o Pai é agora posse dos crentes, e essa vida não é somente um dom de Deus, mas o seu próprio ser.” E Tozer continuou dizendo, de forma lúcida: “Seja o que mais for que ela abranja, a experiência cristã sempre deve incluir um genuíno encontro com Deus. Sem isto, a religião é apenas uma sombra, um reflexo da realidade, uma cópia barata de um original outrora desfrutado por outra pessoa de quem ouvimos falar. Só pode ser uma grande tragédia na vida de qualquer homem, viver numa igreja desde a meninice até avançada idade, e não conhecer nada mais real do que algum deus sintético, composto de teologia e lógica, mas sem olhos para ver, sem ouvidos para ouvir e sem coração para amar.” A Bíblia é riquíssima em textos que tratam do alimento sólido que o cristão deve buscar, vejamos alguns textos: Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim. João 14:6 Aos quais Deus quis fazer conhecer quais são as riquezas da glória deste mistério entre os gentios, que é Cristo em vós, esperança da glória. Colossenses 1:27 E Jesus lhes disse: Eu sou o pão da vida; aquele que vem a mim não terá fome, e quem crê em mim nunca terá sede. João 6:35 Disse-lhe Jesus: Eu sou a ressurreição e a vida; quem crê em mim, ainda que esteja morto, viverá. João 11:25 Estando nós ainda mortos em nossas ofensas, nos vivificou juntamente com Cristo (pela graça sois salvos), E nos ressuscitou juntamente com ele e nos fez assentar nos lugares celestiais, em Cristo Jesus. Efésios 2: 5-6 Porque nele foram criadas todas as coisas que há nos céus e na terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potestades. Tudo foi criado por ele e para ele. E ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por ele. E ele é a cabeça do corpo, da igreja; é o princípio e o primogênito dentre os mortos, para que em tudo tenha a preeminência. Porque foi do agrado do Pai que toda a plenitude nele habitasse. Efésios 1: 16-19 Visto como o seu divino poder nos deu tudo o que diz respeito à vida e piedade, pelo conhecimento daquele que nos chamou pela sua glória e virtude; Pelas quais Ele nos tem dado grandíssimas e preciosas promessas, para que por elas fiqueis participantes da natureza divina, havendo escapado da corrupção, que pela concupiscência há no mundo. II Pedro 1: 3-4 Os textos acima transmitem uma verdade cristalina: A contante experiência pessoal com a pessoa de Jesus é que pode gerar e manter a vida. Se perdermos este fluxo de vida, vamos nos apegar a um complexo de doutrinas e empregar esforço humano exaustivo, até que o nosso cristianismo se transforme em debates de idéias e filosofias. E este é o quadro normal de nossos dias, quando a manifestação da vida de Cristo tornou-se algo distante na maioria. E ninguém pode afirmar que está livre de cair nesta armadilha das trevas. A obra de Cristo no homem se direciona ao mais profundo de seu ser. O Senhor quer reinar em nossas intenções e pensamentos mais secretos. Ele quer dominar nossas motivações. Ele quer ser a origem de nossas reações e ações. Ao olharmos para o sermão do monte (Mateus 5 a 7), nos deparamos com algo impossível de ser realizado pela doutrina. Só a vida de Cristo em nós pode viver naquele nível sobrenatural, por isso o apóstolo Paulo escreveu: “Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou, e se entregou a si mesmo por mim.” (Gal. 2:20). Um irmão, após longos anos servindo ao Senhor, chegou a seguinte conclusão: “Um dia ao começar a vida cristã, achava que Deus havia me chamado para fazer alguma coisa pra Ele. Depois de muito esforço e quase nada feito, descobri que todo esforço de Deus era para fazer algo em mim pelo Espírito. Sua obra não necessita de mim, eu é que necessito Dele. Neste momento o sentimento é paradoxal, cessam-se os esforços e humanamente só preciso descer à casa do oleiro, então percebo que o trabalho de Deus de fato tem inicio em mim. A sensação é terrível: Perda de tempo, vergonha, desmoronamento... A impressão é que Deus está falando: Agora consegui te vencer, posso fazer tudo novo, um vaso, livre, como sempre sonhei. A gloria da cruz é a vitória de Deus sobre o que é humano.” Podemos possuir um vasto conhecimento intelectual das escrituras, empregar métodos humanos e lograr êxito em uma liderança entre os cristãos, mas sem presença da vida. E tudo será inútil. A grande confusão que se instalou na cristandade é a distância entre os homens e Jesus. Muitos ensinos são aplicados para tentar fazer uma obra que somente o Espírito Santo pode fazer: revelar Jesus. Ele se tornou um grande desconhecido dos cristãos. O irmão Watchman Nee anotou: “Se verificarmos nossa experiência, veremos que jamais alguma verdade nos libertou. Podemos Ter falado de doutrinas anos a fio, e, ainda assim não enxergarmos nada. Se nossas palavras se resumem a mera doutrina, estamos manuseando algo morto, tendo como resultado algo artificial, sem vida. A verdade não se refere a palavras a respeito de Cristo; Ele próprio é que é a Verdade. Freqüentemente, os cristãos consideram o ensino como verdades, embora a verdade seja uma pessoa e não algo mais.” Com isto podemos compreender claramente a palavra de Jesus: “E conhecereis a verdade e a verdade vos libertará” (Jo 8:32). Não pense que este texto é um ensino, e sim a agonia do autor em conquistar esta vida sobrenatural. O Senhor quer realizar sua obra em nós. Evidente que um homem em desobediência não poderá desfrutar nenhuma manifestação de Deus, mas quando estamos nos aproximando do Senhor, vamos enxergando e lamentando nossas misérias, pois elas vão ficando evidentes. E é neste momento que o Senhor vai eliminando o nosso ego e estabelecendo sua natureza em nós. O profeta Isaías, um homem temente a Deus, mas que ao se aproximar Dele, teve uma reação típica de qualquer um que tenha essa experiência: “Então disse eu: Ai de mim! Pois estou perdido; porque sou um homem de lábios impuros, e habito no meio de um povo de impuros lábios; os meus olhos viram o Rei, o SENHOR dos Exércitos” (Is. 6:5). Que o Senhor possa realizar em mim e em você sua completa obra. Abandonemos nossas resistências e deixemos que o Senhor liquide nosso ego, com todas suas manifestações pecaminosas, muitas das quais, ocultas aos homens, mas estampadas diante dos olhos de Deus. Que o Senhor consiga fazer em nós este ensino dado ao profeta Jeremias: Levanta-te, e desce à casa do oleiro, e lá te farei ouvir as minhas palavras. E desci à casa do oleiro, e eis que ele estava fazendo a sua obra sobre as rodas, como o vaso, que ele fazia de barro, quebrou-se na mão do oleiro, tornou a fazer dele outro vaso, conforme o que pareceu bem aos olhos do oleiro fazer. Então veio a mim a palavra do SENHOR, dizendo: Não poderei eu fazer de vós como fez este oleiro, ó casa de Israel? diz o SENHOR. Eis que, como o barro na mão do oleiro, assim sois vós na minha mão, ó casa de Israel. Jeremias 1: 2-6 Um dos mais belos hinos já compostos: Em fervente oração, vens o teu coração Na presença de Deus derramar Mas não podes fluir, o que estás a pedir Sem que tudo abandones no altar Quando tudo perante o senhor estiver E todo o teu ser Ele controlar Só então hás de ver, que o Senhor tem poder Quando tudo deixares no altar Se orares então, sem que teu coração Goze a paz que o Senhor pode dar É que Deus não sentiu, que tua alma se abriu Tudo, tudo deixando no altar Maravilhas de amor, te fará o Senhor Atendendo à oração que aceitar Seu imenso poder, te virá socorrer Quando tudo deixares no altar









.

sábado, 9 de janeiro de 2010

PECADORES NAS MÃOS DE UM DEUS IRADO

por
Jonathan Edwards

Sermão pregado em 08 de Julho de 1741 em Enfield, Connecticut - EUA

“... A seu tempo, quando resvalar o seu pé” (Deuteronômio 32.35).

Nesse versículo os ímpios e incrédulos israelitas, que eram o povo visível de Deus, e que viviam debaixo de Sua graça, são ameaçados com a vingança do Senhor. Apesar de todas as obras maravilhosas que Deus operara em favor desse povo, este permanecia sem juízo e destituído de entendimento, como está escrito no versículo 28. e mesmo sob todos os cuidados do céu produziram fruto amargo e venenoso, conforme verificamos nos dois versículos anteriores.
A declaração que escolhi para meu texto, "A seu tempo, quando resvalar o seu pé", parece subentender as seguintes questões, relativas à punição e destruição que aqueles ímpios israelitas estavam sujeitos a sofrer:
1. Que eles estavam sempre expostos à destruição , assim como está sujeito a cair todo aquele que se coloca de pé, ou anda por lugares escorregadios. A maneira como serão destruídos vem aí representada pelo deslize de seus pés. A mesma citação encontramos no Sl 73.18-19, "Tu certamente os pões em lugares escorregadios, e os fazes cair na destruição".
2. Faz supor também que estavam sempre sujeitos a uma súbita e inesperada destruição, à semelhança daquele que anda por lugares escorregadios e a qualquer instante pode cair. O ímpio não consegue prever se, num momento, ficará de pé, ou se, em seguida, cairá. Quando cai, cai subitamente, sem aviso, como está escrito, também, no Sl 73.18-19, "Tu certamente os põe em lugares escorregadios, e os fazes cair na destruição. Como ficam de súbito assolados! Totalmente aniquilados de terror!"
3. Outra coisa implícita no texto é que os ímpios estão sujeitos a cair por si mesmos, sem serem derrubados pelas mãos de outrem, pois aquele que se detém ou anda por terrenos escorregadios não precisa mais do que seu próprio peso para cair por terra.
4. E também a razão pela qual ainda não caíram, e não caem, é por não haver chegado ainda o tempo determinado pelo Senhor. Pois está escrito que quando este tempo determinado, ou escolhido, chegar, seu pé irá resvalar. E então serão entregues à queda, para a qual já estão predispostos por causa do próprio peso. Deus não os susterá mais em lugares escorregadios, mas vai deixá-los sucumbir. Então, nesse exato momento, cairão em destruição, à semelhança daqueles que transitam em terrenos escorregadios, à beira de precipícios, e não conseguem se manter de pé sozinhos,caindo imediatamente e se perdendo ao serem abandonados.
Eu insistira agora num exame maior das seguintes palavras: não há nada, a não ser a boa vontade de Deus, que impeça os ímpios de caírem no inferno a qualquer momento.
Por mera boa vontade de Deus, me refiro à sua vontade soberana, ao seu livre arbítrio, o qual não é restringido por nenhuma obrigação, nem tolhido por qualquer tipo de dificuldade. Em última análise, sob qualquer aspecto, nada, exceto a vontade de Deus, tem poder para preservar os ímpios da destruição por um instante sequer. A verdade dessa observação transparecerá nas seguintes considerações:
1. Não falta poder a Deus para lançar os ímpios no inferno a qualquer momento. A mão dos homens não é suficientemente forte quando Deus se levanta. O mais forte deles não tem poder para resistir-lhe, e ninguém consegue se livrar de suas mãos.Ele não só pode lançar os ímpios no inferno, como pode fazê-lo com a maior facilidade. Muitas vezes, uma autoridade terrena encontra grande dificuldade em dominar um rebelde, o qual acha meios de se fortalecer e se tornar mais poderoso pelo número de seguidores que alicia. Mas com Deus não é assim. Não há força que resista ao seu poder. Mesmo que as mãos se unam, e que enormes multidões de inimigos do Senhor juntem suas forças e se associem, serão todos facilmente despedaçados. São como montes de palha seca e leve diante de um furacão, ou como grande quantidade de restolho perto de chamas devoradoras. Nós achamos fácil pisar e esmagar uma lagarta que se arrasta pelo chão. Achamos fácil também cortar ou chamuscar um fio de linha fino que segura alguma coisa. Então, é simples para Deus, quando lhe apraz, lançar seus inimigos no inferno profundo. Quem somos nós, que imaginamos poder resistir Àquele ante cuja repreensão a terra treme, e perante quem as pedras tombam?
2. Eles merecem ser lançados no inferno. Assim, a justiça divina não se interpõe no caminho dos ímpios; nem faz objeção pelo fato de Deus usar seu poder para destruí-los a qualquer momento. Muito pelo contrário, a justiça fala assim da árvore que produz frutos maus: "... pode cortá-la; para que está ela ainda ocupando inutilmente a terra?" (Lc 13.7). A espada da justiça divina está o tempo todo erguida sobre suas cabeças, e somente a mão de absoluta misericórdia e a mera vontade de Deus podem detê-la.
3. Os ímpios já estão debaixo da sentença de condenação ao inferno. Eles não só merecem ser lançados ali, mas a sentença da lei de Deus, esse preceito de eterna e imutável retidão que o Senhor estabeleceu entre si mesmo e a humanidade, também se coloca contra eles, e assim os mantém. Portanto, tais homens já estão destinados ao inferno. "...o que não crê já está julgado." (Jo 3.18). Assim, todo impenitente pertence, verdadeiramente, ao inferno. Ali é o seu lugar, ele é de lá, como temos em João 8.23: "vós sois cá debaixo" e para lá é destinado. Este é o lugar que a justiçam, a Palavra de Deus e a sentença de sua lei imutável reservam para ele.
4. Assim sendo, eles são objetos da ira e da indignação de Deus, que se manifesta através dos tormentos do inferno. E a razão de não descerem ao inferno agora mesmo não é pelo fato do Senhor, em cujo poder se encontram, estar menos irado com eles no momento, ou, pelo menos, não tão encolerizado como está com aquelas miseráveis criaturas a quem ele atormenta no inferno, as quais experimentam e sofrem ali a fúria de sua indignação. Sim, Deus se acha muito mais furioso com um grande número de pessoas que está vivendo na terra agora, talvez de modo mais tranqüilo e confortável, do que com muitos daqueles que estão experimentando as chamas do inferno. Portanto, a razão porque Deus ainda não abriu a sua mão e os liquidou, não é por ele não se importar com suas iniqüidades, ou não se ofender. O Senhor não se parece com eles, embora pensem que sim. A fúria de Deus arde contra eles, sua condenação não demora. O abismo está preparado, o fogo está pronto, a fornalha incandescente está ardendo, pronta para recebê-los. As chamas vermelhas queimam. A espada luminosa foi afiada e pesa sobre suas cabeças. O inferno abriu a sua boca debaixo deles.
5. O diabo está pronto a cair sobre os ímpios, para apoderar-se deles como coisa sua, no momento em que Deus o permitir. Eles lhe pertencem, suas almas encontram-se em seu poder e sob seu domínio. As Escrituras os apresentam como propriedade de satanás (Lc 11.21). Os demônios os espreitam, estão sempre ao seu lado, à sua direita, esperando por eles como leões esfaimados e enfurecidos que vêem a presa, aguardando a hora de agarrá-la, mas são restringidos por enquanto. Se Deus retirasse sua mão, a qual os refreia, eles cairiam sobre suas pobres almas num instante. A velha serpente está pronta a dar o bote. O inferno escancara sua boca para recebê-los. E se Deus permitisse, seriam rapidamente engolidos e consumidos.
6. Nas almas dos pecadores reinam aqueles princípios diabólicos que os faria arder agora mesmo no inferno, se não fosse a restrição imposta por Deus. Existe na própria natureza carnal do homem uma potencialidade alicerçando os tormentos do inferno. Há aqueles princípios corruptos que agem de maneira poderosa sobre eles, que só dominam completamente, e que são sementes do fogo do inferno. Esses princípios são ativos e poderosos, de natureza extremamente violenta, e se não fosse a mão restringidora do Senhor sobre eles, seriam logo destruídos. Iriam arder em chamas da mesma forma que a corrupção e a rebeldia fazem arder os corações das pessoas condenadas, gerando nelas os mesmos tormentos. As almas dos ímpios são comparadas nas Escrituras com o mar agitado (Is 57.20). Por enquanto Deus controla as iniqüidades deles pelo seu imenso poder, como faz com as ondas enfurecidas do mar, dizendo: "virão até aqui, mas não prosseguirão." Mas se Deus retirasse deles seu poder refreador, seriam todos tragados por elas. O pecado é a ruína e a miséria da alma. Ele é destrutivo pela própria natureza. E se Deus o deixasse sem controle, não seria preciso mais nada para tornar as almas humanas absolutamente miseráveis. A corrupção no coração do homem é algo cheio de fúria incontrolável e sem freio. Enquanto os pecadores viverem aqui, essa fúria será como fogo reprimido pelas restrições divinas. Ao passo que, se fosse liberada, incendiaria o curso natural da vida. E como o coração é um poço de pecado, este mesmo pecado iria imediatamente transformar a alma num forno incandescente ou numa fornalha de fogo e enxofre, caso não fosse restringido.
7. O fato de não haver sinais visíveis da morte por perto, não quer dizer que haja, por um momento, sequer segurança para os ímpios. O fato do homem natural ter boa saúde, de não prever que poderia deixar este mundo num minuto por um acidente, de não haver perigo visível à sua volta, nada disso lhe ser vê de segurança. Contínuas e inúmeras experiências humanas, em todas as épocas, nos mostram que não existem provas de que o homem não esteja à beira da eternidade, ou de que seu próximo passo não venha a ser no outro mundo. Os caminhos e meios, invisíveis e imprevistos, de chegar lá são incontáveis e inconcebíveis. Os homens não convertidos caminham por cima das profundezas do inferno, sobre uma superfície frágil onde existem varias áreas quebradiças, também invisíveis, as quais não conseguirão agüentar o seu peso. As flechas da morte voam ao meio-dia sem serem vistas. O olhar mais atento não pode distingui-las. Deus tem muitas maneiras diferentes e misteriosas de tirar os homens pecadores do mundo e despachá-los para o inferno. Não há nada que faça crer que o Senhor precise de ajuda de um milagre, ou que necessite se desviar do curso natural de sua providência para destruir qualquer pecador, a qualquer momento. Desde que todos os meios para fazer os ímpios deixarem este mundo estão de tal forma nas mãos de Deus, tão absoluta e universalmente sujeitos ao seu poder e determinação, segue-se que a ida dos pecadores para o inferno, a qualquer momento, depende simplesmente da vontade de Deus – quer usando meios ou não.
8. O cuidado e a prudência dos homens naturais em preservar suas vidas, ou o cuidado de terceiros em preservá-las, não lhes dá segurança por um momento sequer. A providência divina e a experiência humana testificam isso. Existem evidências claras de que a sabedoria dos homens não lhes é segurança contra a morte. Se não fosse assim, haveria uma diferença entre a morte prematura e inesperada de homens sábios e prudentes, e dos demais. Mas, o que realmente acontece? "Como morre o homem sábio? Assim como um tolo." (Ec 2.16).
9. Todo o esforço e artimanha dos ímpios para escaparem do inferno não os livram do mesmo, nem por um momento, pois continuam a rejeitar a Cristo, e portanto permanecem ímpios. Quase todos os homens naturais que ouvem falar do inferno alimentam a ilusão de que vão escapar dele. Quanto a sua própria segurança, confiam em si mesmos. Vangloriam-se do que fizeram, do que estão fazendo e do que pretendem fazer. Cada um traça seu próprio plano, pensa em evitar a condenação, e se vangloria e que irá tramar tão bem todas as coisas que seu esquema, com certeza, não falhará. Na verdade, eles ouvem dizer que poucos se salvam, e que a maior parte dos homens que já morreram foram para o inverno; mas cada um deles se imagina capaz de planejar melhor a própria fuga, do que os outros puderam fazer. Dentro de si mesmos dizem que não pretendem ir para esse lugar de tormento, e que pretendem tomar todo o cuidado necessário, esquematizando as coisas de tal forma na ao terem possibilidade de falhar. Mas os insensatos filhos dos homens iludem-se miseravelmente quanto a seus próprios planos. A confiança que depositam na própria força e sabedoria é o mesmo que confiar na fragilidade de uma sombra. A maior parte daqueles que antes viveram debaixo da dispensação da graça, e agora estão mortos, sem dúvida alguma foram para o inferno. E não é por terem sido menos espertos do que os que ainda estão vivos, nem por terem planejado as coisas de tal forma que não lhes assegurou o escape. Se pudéssemos falar com eles, um a um, e perguntar-lhes se, quando vivos, esperavam ser vítimas de tamanha miséria, sem dúvida ouviríamos todos dizer: "Não, eu nunca pensei em vir para cá. Eu tinha esquematizado as coisas de maneira bem diferente. Pensei que iria conseguir algo melhor para mim, que meu plano era adequado. Pensei em me precaver melhor, mas tudo aconteceu de maneira tão repentina. Não esperava por isso naquela época, e nem daquela maneira. Mas tudo veio como um ladrão. A morte foi mais esperta que eu. A ira de Deus foi rápida demais para mim. Oh!, maldita insensatez! Eu me gabava, e me deleitava em sonhos vãos quanto ao que faria no futuro. E justamente quando eu mais falava de paz e segurança, me sobreveio uma súbita destruição."
10. Deus não se sujeita a nenhuma obrigação, nem a nenhuma promessa de manter o homem natural fora do inferno por um momento sequer. Ele não fez absolutamente nenhuma promessa de vida eterna, ou de libertação ou proteção da morte eterna, senão àquelas que estão contidas na aliança da graça – as promessas concedidas em Cristo, no qual todas as promessas são o sim e o amém. Mas obviamente os que não são filhos da aliança da graça não têm interesse na mesma, pois não crêem em nenhuma das suas promessas, e nem têm o menor interesse no Mediador dessa aliança.
Portanto, apesar de tudo que os homens possam imaginar ou pretender sobre promessas de salvação, devido suas lutas pessoais e buscas incessantes, deixamos claro e manifesto que qualquer desses esforços ou orações que se façam em relação à religião, será inútil. A não ser que creiam em Cristo, o Senhor, de modo nenhum Deus está obrigado a conservá-los fora da condenação eterna.
Então, os homens impenitentes estão detidos nas mãos de Deus por cima do abismo do inferno. Eles merecem o lago de fogo e para ele estão destinados. Deus se acha terrivelmente irritado. Seu furor para com eles é tão grande quanto para com aqueles que já estão agora sofrendo o suplício da fúria de sua ira no inferno. Esses ímpios não fizeram absolutamente nada para abrandar ou diminuir sua cólera, portanto o Senhor não está de modo algum preso a qualquer promessa de livramento, nem por um momento sequer. O diabo espera por eles, o inferno já escancarou a sua boca para tragá-los. O fogo latente em seus corações agrava-se agora querendo explodir. E como continuam sem o menor interesse no Mediador, não existem meios, ao alcance deles, que lhes possa dar segurança. Em suma, eles não têm refúgio e nada onde se segurar. O que os retém a cada instante é a absoluta boa vontade divina e a clemência sem compromisso, sem obrigação, de um Deus enraivecido.
Aplicação
Essa mensagem pode despertar as pessoas não convertidas para o significado do perigo que estão correndo. Isso que vocês escutaram é o caso de todo aquele que não está em Cristo. Esse mundo de tormento, isto é, o lago de enxofre incandescente, está aberto debaixo de vossos pés. Ali se encontra o terrível abismo de chamas que ardem com a fúria de Deus, e o inferno com sua imensa boca escancarada. E vocês não têm onde se apoiarem, nem coisa alguma onde se segurarem. Não existe nada entre vocês e o inferno, senão o ar, e só o poder e o favor de Deus podem vos suster. Provavelmente vocês não têm consciência dessas coisas, acham que vão conseguir se livrar do inferno, e não vêem nisso tudo a mão de Deus. E olham as coisas ao seu redor, como o bom estado de vossa saúde física, os cuidados que tomam de vossas vidas, e os meios que usam para vossa própria preservação. Mas essas coisas não representam nada. Se Deus retirasse sua mal, elas de nada valeriam para impedir-vos a queda; elas valem tanto como a brisa tênue que tenta sustentar uma pessoa no ar. Vossas iniqüidades vos fazem pesados como chumbo, pendentes para baixo, pressionados em direção ao inferno pelo próprio peso, e se Deus permitisse que caíssem vocês afundariam imediatamente, desceriam com a maior rapidez, e mergulhariam nesse abismo sem fundo. Vossa saúde, vossos cuidados e prudência, vossos melhores planos, toda a vossa retidão, de nada valeriam para sustentar-vos e conservar-vos fora do inferno. Seria como tentar segurar uma avalancha de pedras com uma teia de aranha. Se não fosse a misericórdia de Deus, a terra não suportaria vocês por um só momento, pois são uma carga para ela. A natureza geme por causa de vocês. A criação foi obrigada a se sujeitar à escravidão, involuntariamente, por causa da vossa corrupção. Não é com prazer que o sol brilha sobre vocês, para que sua luz vos alumie para pecarem e servirem a satanás. A terra não produz de bom grado os seus frutos para satisfazer vossa luxuria. Nem está disposta a servir de palco à exibição de vossas iniqüidades. Não é voluntariamente que o ar alimenta vossos corpos, mantendo viva a chama dos vossos corpos, enquanto vocês gastam a vida servindo os inimigos de Deus. As coisas criadas por Deus são boas e foram feitas para o homem, por meio delas, servisse ao Senhor. Não é com prazer que prestam serviço a outros propósitos, e gemem quando são ultrajadas ao servirem objetivos tão contrários à sua finalidade e natureza. E a própria terra vomitaria vocês se não fosse a mão soberana d'Aquele a quem vocês tanto tem ofendido. Eis aí as nuvens negras da ira de Deus pairando agora sobre vossas cabeças carregadas por uma tempestade ameaçadora, cheia de trovões. Não fosse a mão restringidora do Senhor, elas arrebentariam imediatamente sobre vocês. A misericórdia soberana de Deus, por enquanto, refreia esse vento impetuoso, do contrário ele sobreviria com fúria, vossa destruição ocorreria repentinamente, e vocês seriam como palha dispersada pelo vento. A ira de Deus é como grandes águas represadas que crescem mais e mais, aumentam de volume, até que encontram uma saída. Quanto mais tempo a correnteza for reprimida, mais rápido e forte será o seu fluxo ao ser liberada. É verdade que até agora ainda não houve um julgamento por vossas obras más. A enchente da vingança de Deus encontra-se represada. Mas, por outro lado, vossa culpa cresce dava dez mais, e dia a dia vocês acumulam mais e mais ira contra si mesmos. As águas estão subindo continuamente, fazendo sua força aumentar mais e mais. Nada, a não ser a misericórdia de Deus, detém as águas, as quais não querem continuar represadas e forçam uma saída. Se Deus retirasse sua mão das comportas, elas se abririam imediatamente e o mar impetuoso da fúria e da ira de Deus iria se precipitar com furor inconcebível, e cairia sobre vocês com poder onipotente. E mesmo que vossa força fosse dez mil vezes maior do que é, sim, dez mil vezes maior do que a força do mais forte e vigoroso diabo do inferno, não valeria nada para resistir ou deter a ira divina. O arco da ira de Deus já está preparado, e a flecha ajustada ao seu cordel. A justiça aponta a flecha para vosso coração, e estica o arco. E nada, senão a misericórdia de Deus – um Deus irado! – que não se compromete e a nada se obriga, impede que a flecha se embeba agora mesmo do vosso sangue. Assim estão todos vocês que nunca experimentaram uma transformação real em vossos corações pela ação poderosa do Espírito do Senhor em vossas almas – todos vocês que não nasceram de novo, nem foram feitos novas criaturas, ressurgindo da morte do pecado para um estado de luz, e para uma vida nova nunca experimentada antes. Por mais que vocês tenham modificado a conduta em muitas coisas, e tenham possuído simpatias religiosas, e até mantido uma forma pessoal de religião com vossas famílias e em particular, indo à casa do Senhor, sendo até severos quanto a isso, mesmo assim vocês estão nas mãos de um Deus irado. Somente sua misericórdia vos livra de ser, agora, neste momento, tragados pela destruição eterna. Por menos convencidos que vocês estejam agora quanto às verdades ouvidas, no porvir serão plenamente convencidos. Aqueles eu já se foram, e que estavam na mesma situação que a vossa, percebem que foi exatamente isso que lhes aconteceu, pois a destruição caiu de repente sobre muitos deles, quando menos esperavam, e quando mais afirmavam vier em paz e segurança. Agora eles vêem que aquelas coisas nas quais puseram sua confiança para obter paz e segurança eram nada mais que uma brisa ligeira e sombras vazias. O Deus que vos mantém acima do abismo do inferno vos abomina; ele está terrivelmente irritado e seu furor contra vocês queima como fogo. Ele vê vocês como apenas dignos de serem lançados no fogo. E seus olhos são tão puros que não podem tolerar tal visão. Vocês são dez mil vezes mais abomináveis a seus olhos do que é a mais odiosa das serpentes venenosas para olhos humanos. Vocês o têm ofendido infinitamente mais do que qualquer rebelde obstinado ofenderia a um governante. No entanto, nada, a não ser a sua mão, pode impedir-vos de cair no fogo a qualquer momento. O fato de vocês não terem ido para o inferno a noite passada e de terem tido permissão para acordar ainda aqui neste mundo, depois de terem fechado os olhos ontem para dormir, atribui-se ao mesmo favor. Não existe outra razão porque vocês não foram lançados no inferno ao se levantarem pela manhã, a não ser o fato da mão de Deus ter-vos sustentado. E não existe outra razão porque vocês não caiam no inferno neste exato momento. Oh!, pecador, pense no perigo terrível que se encontra! É sobre uma grande fornalha de furor, sobre um abismo imenso e sem fim, cheio do fogo da ira, que você está pendurado, seguro pela mão de Deus, cujo furor acha-se tão inflamado contra você, como contra muitas pessoas já condenadas no inferno. Você está suspenso por uma linha tênue, com as chamas da cólera divina lampejando à tua volta, prontas para atearem fogo e queimar-te por inteiro. E você continua sem interesse no Mediador, sem nada onde se agarrar para poder se salvar, nada que possa afastar as chamas da cólera divina, nada de teu próprio, nada que tenha feito ou possa vir a fazer, para persuadir o Senhor a poupar tua vida por um minuto sequer. Considere, então, mais detidamente, vários aspectos dessa cólera que te ameaça com tão grande perigo. 1. A quem pertence essa ira? É a ira do Deus infinito. Se fosse somente a ira humana, mesmo a do governante mais poderoso, comparativamente seria considerada como coisa pequena. A ira dos reis é bastante temida, principalmente dos monarcas absolutos, que possuem os bens e as vidas de seus súditos inteiramente sob o seu poder, para serem usados quando bem entenderem. "Como o bramido do leão é o terror do rei; o que lhe provoca a ira peca contra a sua própria vida." (Pv 20.2). O súdito que enfurece este tipo de governante arbitrário, sofre os maiores tormentos que se possa conceber, ou que o poder humano possa infligir. Porém, os maiores principados da terra, em toda a sua grandeza, majestade e poder, mesmo revestidos de seus grandes terrores, não são mais do que vermes débeis e desprezíveis que rastejam no pó, quando comparados com o grande e todo-poderoso criador e rei dos céus e da terra. Mesmo quando estão enraivecidos e sua fúria chega ao máximo, é muito pouco o que podem fazer. Os reis da terra são, perante Deus, como gafanhotos. Valem menos que nada. Tanto o seu amor quanto o seu ódio são desprezíveis. A ira do grande Rei dos reis é muito mais terrível do que a deles, tal como é maior a sua majestade. "Digo-vos, pois, amigos meus: não temais os que matam o corpo e, depois disso, nada mais podem fazer. Eu, porém, vos mostrarei a quem deveis temer: temei aquele que depois de matar, tem poder para lançar no inferno. Sim, digo-vos, a esse deveis temer". (Lc 12.4-5). 2. É à ferocidade de sua ira que vocês estão expostos. Lemos, com freqüência, sobre a ira de Deus, como por exemplo em Is 58.18. "Segundo as obras deles, assim retribuirá; furor aos seus adversários." E também em Is 66.15 "Porque, eis que o Senhor virá em fogo, e os seus carros como um torvelinho, para tornar a sua ira em furor, e a sua repreensão em chamas de fogo." E assim é em muitos outros lugares da Bíblia. Lemos também em ap 19.15: "... o lagar do vinho do furor da ira do Deus todo-poderoso." Essas palavras são incrivelmente aterradoras. Se estivesse escrito apenas a "ira de Deus", isso já nos faria supor algo bastante temível. Mas está escrito "o furor da ira de Deus", ou seja, a fúria de Deus, o furor de Jeová! Oh!, quão terrível deve ser esse furor! Quem pode exprimir ou conceber o que essas palavras contêm? Mas não é apenas isso que está escrito, e sim "o furor da ira do Deus Todo-Poderoso." Essas palavras dão a entender que uma grande manifestação de seu poder onipotente vai acontecer. Através dela ele infligirá aos homens todo o furor de sua ira. Assim como os homens costumam manifestar sua própria força através do furor de sua ira, a onipotência divina irá, da mesma forma, se enfurecer e se manifestar. Então, qual será a conseqüência de tudo isso? O que será do pobre verme que vier a sofrer todo este mal? Que mão serão tão fortes, e que coração conseguirá suportar tanto furor? A que terrível, inexprimível, inconcebível abismo de miséria irá chegar a pobre criatura humana que será vítima disso tudo!
Pensem bem, vocês que estão aqui agora, e que permanecem em estado pecaminoso. O fato de Deus vir a efetivar o furor da sua ira, torna implícito que ele infligirá esse castigo sem compaixão. Quando Deus olhar a indescritível aflição do vosso estado, e vir como vossos tormentos são absolutamente desproporcionais à vossa força, e como vossas pobres almas estão esmagadas, imersas em trevas eternas, não terá compaixão de vocês, não ira deter a execução de sua ira, ou, de forma alguma, tornar mais leve sua mão. Nessa hora Deus não usará de misericórdia para com vocês, nem conterá seu vento impetuoso. Ele não terá consideração para com o vosso bem estar, e nem irá evitar que vocês sofram. Na verdade, fará com que sofram na medida exata que sua rigorosa justiça vier a requerer. Nada será modificado só pelo fato de ser difícil para vocês suportarem. "Pelo que também eu os tratarei com furor; os meus olhos não pouparão, nem terei piedade. Ainda que me gritem aos ouvidos em alta voz, nem assim os ouvirei." (Ez 8.18). Deus está pronto, agora, a usar de compaixão com vocês. Hoje é o dia da misericórdia. Vocês podem clamar neste instante, e ter esperanças de alcançar sua graça. Mas quando o dia da misericórdia passar, vosso lamento, o pranto mais doloroso, os gritos, serão em vão. No que diz respeito ao vosso bem estar, vocês estarão completamente perdidos e alienados de Deus. O Senhor não terá outra opção senão a de entregar-vos ao sofrimento e à miséria. E vocês continuarão não tendo outra perspectiva, pois serão vasos de ira, preparados para a destruição. Não haverá outro uso qualquer para tais vasos, senão o de enchê-los da ira de Deus. Quando clamarem ao Senhor, ele estará tão longe de consolar-vos que, inclusive, está escrito a este respeito que Deus irá, simplesmente, 'rir e zombar' de vocês (Pv 1.25-26).
Vejam quão terríveis são estas palavras do grande Senhor: "O lagar eu o pisei sozinho, e dos povos nenhum homem se achava comigo; pisei as uvas na minha ira; no meu furor as esmaguei, e o seu sangue me salpicou as vestes e me manchou o traje todo." (Is 63.3). É quase impossível se conceber palavras que tragam em si uma manifestação maior destas três coisas: desprezo, ódio e fúria de indignação. Se clamarem a Deus por consolo, ele estará longe de querer vir consolar-vos, ou de querer demonstrar-vos interesse ou favor. Ao contrario, o Senhor simplesmente irá esmagar-vos sob seus pés. E apesar de saber que, ao pisotear-vos, vocês não poderão suportar o peso de sua onipotência, ainda assim ele não vai se importar, e irá esmagar-vos debaixo de seus pés, sem piedade, espremendo o vosso sangue e fazendo com que o mesmo espirre longe, manchando suas vestes, maculando seu traje. Ele não só irá odiar-vos, como devotará a vós o maior desprezo. Lugar algum será considerado próprio para vocês, a não ser debaixo de seus pés, para serem pisados como a lama das ruas.
3. A miséria a que vocês estão sujeitos é aquela que Deus vos infligirá, a fim de demonstrar a força da ira do Senhor, Deus tem em seu coração a intenção de mostrar aos anjos e aos homens, não só a excelência do seu amor, como a severidade de seu furor. Às vezes os governantes da terra resolvem mostrar a força de sua ira através de castigos extremos que mandam infligir sobre aqueles que os enfurecem. Nabucodonosor, o poderoso e arrogante rei do império dos caldeus, demonstrou seu furor quando, ao se irritar com Sadraque, Mesaque e Abdenego, ordenou que se acendesse a fornalha de fogo ardente sete vezes mais do que o normal. Como era de se esperar, a fornalha foi aquecida intensamente, até atingir o mais alto grau que poderia produzir. O grande Deus também quer revelar a sua ira, e exaltar sua tremenda majestade e grandioso poder através dos sofrimentos desmedidos de seus amigos. "Que diremos, pois, se Deus querendo mostrar a sua ira, e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita longanimidade os vasos da ira, preparados para a perdição." (Romanos 9.22). E visto que esse é o seu desígnio e o que ele determinou, ou seja, mostrar quão terrível e ilimitada é a ira, a fúria e a indignação do Senhor, ele o mostrará realmente. Será realizado algo horrendo, muito terrível. Quando o grande e furioso Deus tiver se levantado e executado sua terrível vingança sobre o mísero pecador, e o desgraçado estiver sofrendo o peso e o poder infinito de sua indignação, então Deus chamará o universo inteiro para contemplar a imensa majestade e o tremendo poder que nele existe. "Os povos serão queimados como se queima a cal, como espinhos cortados arderão no fogo." "Ouvi vós os que estais longe, o que tenho feito; e vós, que estais perto, reconhecei o meu poder. Os pecadores em Sião se assombram, o tremor se apodera dos ímpios; e eles perguntam: quem dentre nós habitará com o fogo devorador? Quem dentre nós habitará com chamas eternas?" (Isaías 33.12-14).
Assim será com vocês que não são convertidos, se permanecerem neste estado. O poder infinito, a majestade e a grandiosidade do Deus onipotente serão exaltados em vocês através da inexprimível força dos tormentos que vos sobrevirão. Vocês serão atormentados na presença dos santos anjos e na presença do Cordeiro. E quando estiverem nesse estado de sofrimento, os gloriosos habitantes do céu sairão para contemplar esse espetáculo horrendo, e verão como é a fúria do Todo-poderoso. E quando virem todas essas coisas, se prostrarão e adorarão seu grande poder e majestade. "E será que de uma lua nova à outra, e de um sábado a outro, virá toda a carne a adorar perante mim, diz o Senhor. Eles sairão, e verão os cadáveres dos homens que prevaricaram contra mim; porque o seu verme nunca morrerá, nem o seu fogo se apagará; e eles serão um horror para toda a carne." (Isaías 66.23-24).
4. É uma ira eterna. Já seria algo terrível sobre o furor e a cólera do Deus Todo-poderoso por um momento. Mas vocês terão de sofrê-la por toda a eternidade. Essa intensa e horrenda miséria não terá fim. Ao olhar para o futuro, vocês verão à frente uma interminável eternidade, de duração infinita, que irá devorar vossos pensamentos e assombrar vossas almas. E vocês irão se desesperar, com certeza, por não conseguirem nenhum livramento, termo, alívio ou descanso para tanta dor. Saberão também, que terão de sofrer até à última gota por longos séculos, por milhões e milhões de anos, lutando e pelejando contra essa vingança inclemente e todo-poderosa. Então, depois de passar por tudo isso, quando tantos séculos vos tiverem consumido, saberão que tudo não passa apenas de uma gota d'água quando comparado ao que ainda resta. Portanto, vosso castigo será, com certeza, infinito. Oh!, quem poderia exprimir o estado de uma alma em tais circunstâncias? Tudo o que pudermos dizer sobre o assunto, vai nos dar, apenas, uma débil e frágil visão da realidade. Ela é inexprimível, inconcebível, pois "Quem conhece o poder da ira de Deus?"
Que horrendo é o estado daqueles que diariamente, a cada hora, se encontram em perigo de sofrer tamanha ira e infinita miséria! Mas esse é o caso sinistro de toda alma que ainda não nasceu de novo, por mais moral, austera, sóbria e religiosa que seja. Queira Deus vocês pensassem em todas essas coisas, sejam jovens ou velhos. Há razões de sobra para acreditar que muitos daqueles que ouviram o evangelho certamente estarão expostos a esse tormento por toda a eternidade. Não sabemos quem são eles, nem o que pensam. Pode ser que estejam tranqüilos agora, escutando esta mensagem sem se perturbarem muito, e que estejam até se gabando de que, no caso deles, conseguirão escapar. Se soubéssemos que dentre os nossos conhecidos existe uma pessoa, uma só, sujeita a sofrer tal tormento como seria doloroso para nós encarar o assunto. Se conhecêssemos essa pessoa, sempre que a víssemos uma tal visão seria terrível para nós. Iríamos todos levantar grande choro, e prantear por sua causa. Mas, infelizmente, em vez de uma pessoa só, é provável que muitos se lembrem destas exortações somente no inferno! E inúmeras pessoas podem estar no inferno em breve tempo, antes mesmo do ano terminar. E aqueles que estão agora com saúde, tranqüilos e seguros, podem chegar lá antes do amanhecer. Todos os que dentre vocês continuarem até o fim em estado natural pecaminoso, e que conseguirem ficar fora do inferno por mais tempo, estarão lá também em breve. Sua condenação não tardará; virá de súbito, e provavelmente para muitos de vocês, de maneira repentina. Vocês têm toda razão em se admirarem de não estar ainda no inferno. É ocaso, por exemplo, de alguns conhecidos seus, que não mereciam o inferno mais do que vocês e que antes aparentavam ter possibilidade de estarem vivos agora tanto quanto vocês. Para o caso deles já não há esperança. Estão clamando lá em extrema penúria e perfeito desespero. Mas aqui estão vocês, na terra dos vivos, cercados pelos meios de graça, tendo a grande oportunidade de obter a salvação. O que não dariam aquelas pobres almas condenadas, desesperadas, pela oportunidade de viver mais um só dia, como que vocês desfrutam neste momento!
E agora vocês têm uma excelente ocasião. Hoje é o dia em que Cristo abre as portas da misericórdia de par em par, e se coloca de pé clamando e chamando em alta voz aos pobres pecadores. Este é o dia em que muitos estão se reunindo a ele, se apressando em chegar ao reino de Deus. Inúmeros estão vindo diariamente do norte, sul, leste e oeste. Muitos que estavam até bem pouco tempo nas mesmas condições miseráveis que vocês estão felizes agora, com os corações cheios de amor por Aquele que os amou primeiro, e os lavou de seus pecados com seu próprio sangue, regozijando-se na esperança de ver a glória de Deus. Como é terrível ser deixado para trás num dia assim! Ver os outros se banqueteando, enquanto vocês estão penando e se definhando! Ver os outros se regozijando e cantando com alegria no coração, enquanto vocês só têm motivos para prantear por causa do sofrimento de seus corações, e de lamentar por causa das aflições e vossas almas! Como podem vocês descansar por um momento sequer em tal estado de alma? Será que vossas almas não são tão preciosas como as almas daqueles que, dia a dia, estão se juntando ao rebanho de Cristo?
Não existem, porventura, muitos que, apesar de estarem há longo tempo neste mundo, até hoje não nasceram de novo, e por isso são estranhos à comunidade de Israel, e nada têm feito durante a vida, a não ser acumular ira sobre ira para o dia do castigo? Oh! senhores, o caso de vocês é, sem dúvida, extremamente perigoso. A dureza de vossos corações e a vossa culpa são imensas. Acaso vocês não vêem como geralmente pessoas de vossa idade são deixadas para trás na dispensação da misericórdia de Deus? Vocês precisam refletir e despertar de vosso sono, pois jamais poderão suportar a fúria e a ira do Deus infinito. E vocês que são rapazes e moças, irão negligenciar este tempo precioso que desfrutam agora, quando tantos outros jovens de vossa idade estão renunciando às futilidades da juventude e acorrendo céleres a Cristo? Vocês têm neste momento uma oportunidade, mas se a desprezarem, sucederá o mesmo que agora está acontecendo com todos aqueles que gastaram em pecado os dias mais preciosos de sua mocidade, chegando a uma terrível situação de cegueira e insensibilidade. E vocês crianças, que não se converteram ainda, não sabem que estão indo para o inferno onde sofrerão a horrenda ira daquele Deus que agora está encolerizado contra vocês dia e noite? Será que vocês ficarão felizes em ser filhos do diabo, quando tantas outras já se converteram e se tornaram filhos santos e alegres do Rei dos reis?
Queira Deus todos aqueles que ainda estão fora de Cristo, pendentes sobre o abismo do inferno, quer sejam senhoras e senhores idosos, ou pessoas de meia idade, quer jovens ou crianças, que possam dar ouvidos agora aos chamados da Palavra e da providência de Deus. Este ano aceitável do Senhor que é um dia de grandes misericórdias para alguns, sem dúvida será um dia de extremo castigo para outros. Quando negligenciam suas almas os corações dos homens se endurece, e a sua culpa aumenta rapidamente. Podem estar certos, porém, que agora será como foi nos dias de João Batista. O machado está posto à raiz das árvores; e toda árvore que não produz fruto, deve ser cortada e lançada no fogo.
Portanto, todo aquele que está fora de Cristo, desperte e fuja da ira vindoura. A ira do Deus Todo-poderoso paira agora sobre todos os pecadores. Que cada um fuja de Sodoma: " Livra-te, salva a tua vida; não olhes para trás, nem pares em toda a campina; foge para o monte, para que não pereças ."
“E assim, conhecendo o temor do Senhor, persuadimos aos homens”. “De sorte que somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio. Em nome de Cristo, pois, rogamos que vos reconcilieis com Deus”. (II Coríntios 5.11-20; 6.2). “Buscai o Senhor enquanto se pode achar, invocai-o enquanto está perto. Deixe o perverso o seu caminho, o iníquo os seus pensamentos; converta-se ao Senhor, que se compadecerá dele, e volte-se para o nosso Deus, porque é rico em perdoar” . (Isaías 55.6-7). Amém.



















.